segunda-feira, 31 de março de 2014

Nós somos os culpados pelos 65,1% de energúmenos que elas não merecem


Nós falamos para a mocinha se comportar. Nós falamos para a mocinha sorrir e ser simpática. Nós falamos para a mocinha não usar roupas curtas nem chamar a atenção. Nós falamos para a mocinha se dar o valor. Nós falamos para a mocinha tomar muito, muito cuidado quando anda sozinha à noite.
Nós nunca ensinamos o mocinho a não estuprar.
Nós nunca ensinamos o mocinho a respeitar a mocinha. Nós nunca ensinamos o mocinho a não vomitar cantadas babacas para a mocinha. Nós nunca ensinamos o mocinho a não encostar na mocinha contra a vontade dela.
Nós ensinamos o mocinho a fazer piadinhas imbecis sobre a mocinha. Nós ensinamos o mocinho a pegar geral e ser machão. Nós ensinamos o mocinho a hipersexualizar a mocinha nos filmes, jogos e gibis. Nós ensinamos ao mocinho que a mocinha pode usar saia nos eventos de negócios porque a mocinha é um objeto de decoração, enquanto o mocinho está lá para tratar de negócios. Nós ensinamos ao mocinho que ele é razão e que a mocinha é emoção. Ou seja, ensinamos ao mocinho que só ele pensa, só ele planeja e lidera, enquanto a mocinha apenas se cala e obedece. Nós ensinamos ao mocinho que ele está no seu direito de agarrar a mocinha pois afinal o mocinho tem os seus impulsos. Nós ensinamos o mocinho que ele está no seu direito de ter sexo a hora em que quiser com a mocinha, não interessa se a mocinha quer ou não. Nós ensinamos ao mocinho que quando a mocinha diz não ela está fazendo charminho. Nós ensinamos ao mocinho que ele pode ter a mocinha sempre que ele quiser.
Nós ensinamos ao mocinho que homem é sinônimo de raça humana, e ensinamos à mocinha que mulher é sinônimo de esposa.


Apontamos o dedo e chamamos de monstro o cara que agarra a mocinha no beco escuro. Nós falamos que temos de cortar o pau do monstro fora. Nós nos sentimos mocinhos de bem e defensores dos bons costumes.
Nós não admitimos que somos estupradores quando somos senhores trabalhadores casados que forçamos nossas esposas ao sexo quando elas não querem. Nós não admitimos que somos estupradores quando somos namorados amorosos que xingam e aterrorizam nossas namoradas quando elas não querem fazer sexo conosco - afinal, pagamos o jantar e abrimos a porta do carro, então é nosso direito, certo? Não admitimos que somos estupradores quando somos meninos estudiosos de boas notas que passam a mão nas meninas na balada contra a vontade delas. Nós não admitimos que somos estupradores quando vomitamos cantadas escrotas a todo momento - ora, a culpa não é nossa, afinal ela tem bunda grande, ela usou roupa curta, ela estava pedindo por isso, ela já trepou comigo uma vez, como é que desta vez ela diz que não quer?
Nós não admitimos que somos estupradores quando forçamos a mocinha que diz não. A mocinha faz charminho, todo mundo sabe disso. A mocinha é complicada, nunca entendemos a mocinha, a mocinha é só emoção e nada mais. Assim ensinam a nós, mocinhos.
E nós, mocinhos, moleques que se acham homens, que se acham machos, nós, homens, jamais assumimos a responsabilidade. Jamais admitimos que a culpa de tantas mocinhas, de tantas mulheres, de tantas rainhas estupradas em sua dignidade, integridade, destroçadas em sua alma, jamais admitimos que a culpa é nossa, e apenas nossa.
Nós, homens, somos os culpados pelos 65,1% que elas não merecem.
Nós, moleques que se acham homens, os que se consideram estar entre os 34,9% restantes, será mesmo que respeitamos as mulheres? Revejam suas ações, prestem a atenção no que fazem e como agem. Prestem a atenção no que vocês pensam a respeito das mulheres. Ensinem a si próprios. Ensinem os seus amigos. Ensinem os seus filhos.
Apontar dedos é bonito, declarar indignação publicamente e escrever texto bonitinho é daorinha. Mas não adianta porra nenhuma se você não age como fala. 

A culpa é toda nossa.

**As opiniões expressas nesse post são de total responsabilidade do seu autor.**

terça-feira, 25 de março de 2014

Idiotices do João [61]


ATO 1: O EXCESSO
- Você estava fazendo caras e bocas, achei que fosse exagero seu, até você sair do nada, bem no meio da reunião.
O gato estava de tocaia na porta do banheiro, mas aí você encostou nele e ele rosnou para você. Sentiu vontade de partí-lo em pedaços. As raivas se acumulam, sejam de pessoas ou animais. A irmã desejou sua angústia publicamente, vomitou as dores de suportar em silêncio os dedos apontados e as risadinhas atravessadas, outro continua fervilhando muita raiva pelas condições desiguais e conceituadas previamente, antes de qualquer julgamento justo, sabemos do que se trata mas ainda não revelaremos, o gato rosnou, embora João é que seja o verdadeiro dono da casa, exageros, o excesso de emoções se avoluma, Maria respondeu sua mensagem após um milhão de anos, a Rainha Luz segue em sua luta pelo direito de continuar existindo em toda a sua majestade, você está feliz, meu filho?, sim, estou feliz, mente João, estou feliz por estar respirando lindamente, a gangorra se moveu e agora está até genuinamente contente, o Senhor Escuro está cutucando outra vez, o calabouço parece convidativo uma vez mais, não quero o velho João de volta, disse a irmã mais nova, você está cumprindo as suas obrigações, meu caro João?, meu nome é John Doe, a Gata da Literatura compartilhou um pouco dos seus desamores, estamos todos tentando, as tristezas dão-se as mãos para dançar, mais um trecho cliché e inútil, estou cavando para sentir novamente, estou tentando redescobrir, fechar-se para bloquear o excesso, e a vontade de rosnar?, e a vontade de urrar?, está retornando, recaídas, soltou um palavrão e quase brigou com um desconhecido só porque as empanadas demoraram?, o Senhor Escuro está cutucando, quantos poderes maiores poderemos manipular agora?, o sopro dos antepassados foram suplantados pelos ritos de passagem, agora devemos seguir alimentando o sangue dos espíritos, nós não, há apenas eu, John Doe, meu nome é John Doe e eu sou uma miríade de excessos, prefiro que eu mesmo fervilhe no caldeirão de emoções do que testemunhar todos vocês sofrendo, vocês sofrem e eu sofro, por favor, sorriam e sejam felizes.


ATO 2: O ISOLAMENTO
Eu estou aqui. Meu nome é Preste João. Sou o senhor mais rico de todos os mundos existentes e imagináveis. Sou o senhor do Continente e o meu destino é se sentar no mais alto de todos os tronos. E estou só.
Quando os Portões do Sol se fecham, não sinto mais nada - ou ao menos é o que gosto de fingir para mim mesmo. As ideias se retorcem e contorcem enquanto releio as fábulas. O senhor literal de direito pode mesmo reescrever o universo? Posso manipular o que eu quiser, se tiver coragem para tanto. As esperanças tentam se soltar dos grilhões para copular bêbadas umas com as outras. Podemos cagar agora? Não precisamos nos restringir, não nõs, apenas eu, João Lumumba, lembre-se do seu nome, sou um perito em criar novas realidades, a canção é triste, bem ao meu gosto, não compreendo seu idioma porém provém das terras antigas de onde vieram o sangue dos espíritos em minhas veias, a mágica trabalha de formas ritualísticas previsíveis mas podem conjurar demônios em choques de retorno, já os poderes da mente são os poderes da alma, uma vez que a alma está devidamente alojada na cabeça, a cabeça controla tudo, soltei um spoiler mas ninguém dá a mínima para o que é dito aqui então não há problemas, deveríamos, digo, deveria eu produzir mais, produzir produzir produzir, seja útil ao mundo e tenha créditos, o cara lá é cineasta, poeta, repórter, dramaturgo, pedreiro, piloto de fórmula 1 e embaixador de Moru-Moru, eles têm de ser tudo ao mesmo tempo, coleção de profissões, não pode ser simplesmente uma pessoa?, não pode se apresentar como João das Neves, aquele que não sabe de nada?, está usando recurso proibido, não era pra superar o velho bonachão?, iremos sim, digo, irei, eu irei, olha as recaídas, o que é que sinto quando estou aqui sozinho no calabouço?, o que é podemos, o que é que posso concluir?, agora estou simplesmente caindo, porque a voz dela é linda e me lembra Maria, porque ela é a Maria e eu estou caidinho, cale-se, ninguém dá a mínima para isto aqui mas na verdade é que estão de olho sem dizer nada, tenho mais para revelar mas nem morto nem bêbado que direi abertamente, aliás não bebo faz um milhão de anos, o que são os meus sentimentos, eu não estou falando tudo, nem de longe, estou percebendo, mesmo aqui estou me controlando, então o que adianta?, o universo pode se reconstruir?, minha essência é a das profundezas…?, achei que fosse o dinamismo louco que cavalga as chamas loucas da criatividade, embora eu, João Kalumba, deseje mesmo é a tranquilidade do equilíbrio, mentira, eu busco sempre pessoas danificadas, nem percebo, mas sempre me apaixono por pessoas danificadas como eu, cuidado para não falar demais, muito cuidado, cuidado para não se apressar, as pessoas se assustam, correm para bem longe, Maria está fechada, fechada e abrindo-se aos poucos, é muita responsabilidade, isto aqui não é um joguinho de criança, a brincadeira acabou e você deve assumir a responsabilidade, quando você tenta transpor os muros que uma pessoa ergueu ao redor de si para alcançar seu danificado coração você deve fazê-lo com muito respeito e carinho, e amor, deve assumir a responsabilidade!, desejamos apenas o amor, nós somos o amor, eu, eu, mas deseja que sejamos nós, desta vez duas pessoas de verdade e não apenas imaginários alter-egos conflitantes e dolorosamente patéticos, assuma os fardos de um homem, pelo amor dos ancestrais, você atravessou o inferno para superar os seus ritos de passagem, agora é a vez de se esforçar ainda mais para dar o sangue, o sangue dos espíritos, estamos todos rodeados de malditos moleques destruidores de corações e almas, malditos garotinhas de peito estufado que destroçam belíssimas garotas e as danificam para sempre, seja o homem digno para Maria, seja um homem digno para a Rainha Luz, para os seus amigos, para todos que te amam, tente ser mais gentil para consigo próprio, seja menos cego, seja um homem digno para si próprio, seja o Grande João, todos nós agradecemos, muito obrigado, boa noite.

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quarta-feira, 19 de março de 2014

Idiotices do João [60]


Sem o menor motivo aparente, João paralisou-se de vergonha.
Perante a plateia incidental, perante os comprantes em potencial, Joãofez o favor supremo a si próprio de se esconder no primeiro buraco que achou: o boicote auto-declarado. Fechou-se como uma tartaruga, sorriu feito um palerma, apequenou-se feito um idiota desses qualquer. E, é claro, chicoteou-se deliciosamente mais tarde.
Eu deveria voar, porém ainda me escondou dentro do guarda-roupa. Os trajes mais claros não são suficientes quando a escuridão dá umas estocadas incidentais na autoestima vacilante. Sou o mais forte, repete-se, sou o mais forte, não sei nem o que dzer aqui, mas a melhor amiga disse para desenvolver. Olharam, sabe-se lá o que pensaram, são de cores diferentes, olharam; é a melhor amiga, afinal, aquela que compreende o que a maioria não faz ideia. Não é da conta de vocês.
A antiga professora surgiu de repente. Reconheceu João pelos trejeitos, pela energia, pela voz. João destaca-se, mesmo quando tenta se esconder. Boicota-se, seguindo uma programação arcaica ainda não superada. Mas ainda assim se destaca. E as pessoas se lembram, por longos anos. Talvez para sempre. A antiga professora ainda recita a produção dele, João, para os alunos, e os alunos, muito admirados e impressionados, perguntam nervosamente quem diabos é esse cara. E João não acredita.
João detesta usar o telefone. Detesta. João ligou para a Maria, a senhora sua rainha, ligou desajeitado porém ligou, reunindo coragem sabe-se lá de onde. João falou, falou, e ainda encontrou tempo para se chicotear, alegando falta de firmeza nas palavras. Mas João falou, fazendo um grande favor a si próprio de se lembrar da doçura que lhe característica. Porém, alta faltou algo. João segue sangrando no arame farpado das autocobranças. Sempre mais, sempre deveria fazer mais, sempre deveria ser mais.
Nas Terras Natais, o evento ocorreu. Encontrou-se com os companheiros de uma vida passada. João havia morrido sem se despedir, mas ainda assim eles foram lá, não todos, porém os mais queridos se apresentaram. João morreu muitas vezes sem dizer uma palavra para os que ficaram para trás, para renascer em novas terras de sua nova fase. A queridíssima Luz Real superou seus próprios limites, uma vez mais, para estar presente na maior realização de sua cria até o presente momento. A vitória do João é a vitória dela, pois ele é produto desta que é a maior luz de todos os tempos.
Um dia, a luz se apagará…
…e João cerra os punhos para honrar o sangue real da Luz Rainha, a mais poderosa de todas as guerreiras do mundo visível.
João sorri em voz alta, na frente de todos. Sorriu em voz alta pelo direito supremo de assumir para si próprio sua maior causa nesta terra, sorriu em voz alta pela glória máxima de assumir para si próprio sua profissão de fé, sorriu escancaradamente aos berros pela premissa definitiva de assumir para a sua própria alma que persiste no processo lento e gradual de melhora e engrandecimento. A escuridão sempre cutucará, sempre, porém jamais o cobrirá novamente. A monja disse que João é como Lúcifer, “perambula pela escuridão mas na verdade deseja a luz”; João abandonou a Corte Unseelie e assumiu seu Legado Seelie, ainda que sua herança cutuque, cutuque… pois cutuque o quanto quiser. João permite que seu sorriso brilhe pela noite. E então declara publicamente o quanto ama seu novíssimo filho.
João está vivo para amar novamente.

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segunda-feira, 10 de março de 2014

Idiotices do João [59]


“João, você é a pessoa mais perturbada que eu conheço”.
Meu nome é João Silva, mas pode me chamar de John Doe. Estive por aqui, num dia desses qualquer, passaram tempos até que eu resolvesse me pronunciar novamente, e muitas eras se passariam se eu não me forçasse a estar aqui, alguma angústia, alguma, sabe, não estou mais em pedaços, a fragmentação se foi, não há mais nós, apenas eu, eu, eu, eu, eu sou João, o galo teve a garganta cortada e eu admirei o filete de sangue descendo até o falo, foi uma das visões mais bonitas de toda a minha vida, tenho de relembrar, os deuses foram acalmados e alcancei um estado genuíno de plenitude, eu poderia florear um pouco mais, poderia, dar maiores detalhes seria um desrespeito, eu nem deveria tocar neste assunto, qual a dificuldade de conversar?, todos os demais parecem ter muito a dizer, estamos vomitando palavras apenas para compor umas páginas?, compartilhar sentimentos, compartilhar um quinhão do rio subterrâneo que corre enlouquecido dentro de mim, isso é mesmo válido?, a rainha que encontrei, é a Maria, a Maria, ela é a Maria, a mais bela de todas as mulheres nesta terra, voltei ao estado primordial de clichê, no qual um indivíduo do sexo masculino derrete-se em amores por uma pessoa excepcional, não diga a palavra, não diga o verbo mágico, ainda é cedo, porque não se sabe o que é, você está perdendo a beleza do dizer e o sabor de contar, isto aqui está horrível, deveria eu enfeitar?, ninguém entenderá ou se dará conta, agora que foi dito parece meio bobo, e eu estou me justificando outra vez, você acha mesmo que conseguirá preencher as expectativas de todos?, está se esvaindo, talvez não dure este ano, já tomou as medidas legais?, seu coração está realmente preparado?, eu tive de me tornar um homem adulto, houve o ritual de passagem, você se lembra?, se sente poderoso agora?, vários procedimentos em andamento, não consegue mais falar da Maria?, outras pessoas ao redor, sondando e cutucando, se alimentam da esperança de um par aparentemente perfeito, eu me esquivei, mas me diga, como é que você está?, por que você sumiu, perguntam ao João, por que você não aparece mais?, o que é aparecer?, o que é comparecer?, passou o ritual de passagem, caí no abismo escuro e renasci trajado de branco, assim como o mago daquele livro que você adora tanto, estou falando e banalizando as mitologias que existem dentro de mim, o sonho é um mito pessoal, eu acredito nos deuses que fervilham dentro de mim, acredito mesmo?, as leituras se enfureceram, absorvi um monte porém não consigo compartilhar nada, não é um momento adequado de inspiração porém algo deve ser dito, eu melhorei ao menos?, estou assustado, entretanto estou enfrentando, estou encarando?, estou, estou aqui dizendo, voltarei ao caldo primordial, já fiz isso, já morri e renasci, eu sou o meu próprio mito, devo insistir mais, devo ousar mais, mais mais mais, cuidado com essas cobranças desmedidas, na verdade estou seguindo meu próprio ritmo, e deixando que as coisas aconteçam em seu próprio tempo, “deixe que a vida desenrole pra te surpreender”, eu acredito, eu tenho certeza, ela diz que tenho de ter pé no chão e plano B, C, D, estou voando!, estou voando alto, cortando os céus, repleto de alegria e esperança, minha mente é a minha fortaleza, eu sou o mais forte, eu sou, tenho certeza absoluta disso, estou voando através dos céus, dilacerando todos os meus medos e energizando todas as minhas virtudes, eu vencerei, estou vencendo, eu vencerei e compartilharei com as minhas amadas pessoas, assim como as amadas pessoas minhas compartilham suas alegrias e tristezas, seremos companheiros, Maria e eu, individualidade compartilhada, é no que acreditamos, há amor, há amor que cresce devagar, com a lentidão que tornará este amor muito forte, o mais forte de todos, eu sou João e esse é um quinhão da minha história, vamos compartilhar os rios subterrâneos que correm enlouquecidos dentro de todos nós e vamos sorrir.

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