terça-feira, 11 de junho de 2013

Idiotices do João [41]


João deu um tiro na própria testa, pois sentiu-se menor perante a imensidão do sucesso.
O sucesso escarneceu dos receios de João no momento em que Maria subiu no palco para receber o grande prêmio internacional de reconhecimento por sua árdua dedicação ao seu trabalho e à sua equipe. João pestanejou enquanto o prêmio era entregue pelos patrícios daquele mundo que João não compreende. Está se cobrando outra vez, está-se exigindo excelência de desempenho. Todos os dias repete a mesma ladainha, está vomitando sem parâmetro. Houve o diálogo coletivo, a poetisa da Grande Sensibilidade, adorada e de pés beijados, sábados e sábados de dedicação, realizaram o seminário apaixonado, o que João aprendeu? Está se iludindo para tentar sentir. Está fechado outra vez. Embaralhado. Não era Maria que ele beijou. Não era. Não será. Desculpe-me. Maria subiu ao palco para receber o prêmio e apresentou seu marido. Enquanto isso, João foi atacado pela paródia para que de paródia pudesse servir outra vez. Apenas um arremedo de ser humano, João se curva, sorri patético. Melhor mesmo meter uma bala na cabeça.
João poderia ter-se jogado da janela, se tivesse maior coragem. Foi-se deitar esmagado pela tristeza, derrotado pelo peso do seu mundo medíocre, incapaz de reagir contra si próprio. Novamente, falta sensibilidade e aprofundamento. Sempre se justificando. Em qualquer outra ocasião, fantasia orações fabulosas e textos magninânimos. As tais palavras estupendas simplesmente desaparecem na hora em que tem de escrevê-las. Ridículo, caro João, ridículo.
Escuridão se contorce sempre. Está escuro, sempre. Poderia espernear. Mais fácil desistir. Permite-se esmagar. Falta tino. Está-se cobrando outra vez. Amanhã será mais um procedimento igual a todos os outros, ambiente estéril, todos fazendo as mesmas coisas sempre. Eles têm é de quebrar tudo, sim, têm de ir às ruas urrar contra, mas aí o coleguinha ao lado balbucia mais uma opinião viciada e imbecil, contra a gritaria que ele acha lindo quando é lá fora. A mesma idiotice, cercado de estúpidos, incluindo o clichê de dizer isto.
E nem se compara com a poetisa do seminário. Falta sensibilidade, para variar.
João nem está escolhendo o que dizer. Criatura deprimente! Órfão do próprio estilo, o melhor que pode fazer é criticar a si próprio. Irrita-se com o ranger da porta. Detalhe insignificante. Irrita-se com superficialidades. Sentado, olhando para a tela, sentado, todos os dias, gralhas gargalham, proferem imbecilidades de sempre, de sempre, a mesma merda sempre sempre sempre, estéril, o seminário da poetisa, escreveu um monte, grande obra, extensa obra, emocioadas, emocionadas, admiram tanto a grande escritora, lambem os pés do doutor escritor de direito, sempre, sempre, vão todos para suas casas, vidinhas, vidinhas, lambem os pés dos doutores celebridades, arrastam-se todos os dias, gargalham, gargalham as gralhas, maldizem os badernistas da televisão, aplaudem quando os do norte fazem a mesmíssima coisa, vidinha, vidinha, vidinhas, não foi Maria quem você beijou, não foi, Maria estava ganhando prêmio, você embasbado e inútil, ridículo, nada representa para o mundo, nada acrescenta, não é um senhor doutor, nunca alcançará tamanho prestígio, nunca, nunca, remoe-se em inveja, inveja dos casais, inveja dos que têm os pés lambidos, permitiu-se vitimar pela ilusão da vida feliz, deixou-se iludir, deseja beleza e destaque, a mesma merda dos que você critica, a mesma idiotice, tão parvo e deprimente como todos os demais, Maria ganhou o prêmio internacional e apresentou seu marido, João foi agarrado pela paródia na frente de todos, todos riram da paródia que é o João, nunca será merda nenhuma, remoe-se no quarto escuro, solitário e ridículo, amargo e retorcido, foi-se deitar, esmagado pelo peso do seu mundinho medíocre.
**As opiniões expressas nesse post são de total responsabilidade do seu autor.**

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