sexta-feira, 15 de junho de 2012

Recanto das palavras perdidas


O vento apenas dirige o olhar levemente a uma folha amassada que cedo espreita na alta murada, como se nada quisesse. O espírito do tempo mal contado nunca foi acertado de forma errada. Nunca se soube fazer de outro modo. A tradição já fora estabelecida por ventos recorrentes anteriores, e a pureza anterior não seria questionada por areias de desertos terrenos. Era simplesmente desnecessário. Não se fazia precisa a presença aérea de saberes incongruentes ou de aferições técnicas da realidade. O ar era suficiente. Nada que constituísse arcabouço refutável seria atribuído a cem mil folhas destoantes do monte que se encontrava leve e liberto, próximo do calor juvenil. 
Nada que soubesse o espaço que ocupava seria dotado de alguma senil importância. Nada que ousasse honrar a faltante inadequação seria meramente considerado plausível por alguma referência perolada. A pérola se colocava entre o dissabor e a queda, de forma que nada conseguisse discernir onde o fervor acabava e o tremor principiava. A porta entreaberta acolhia o desamparo juntamente às gotas que se avolumavam no nulo espaço do sem-chão.
 A vivenda tinha sido esquadrinhada pelo som dos séculos que não ecoavam mais, e permanecia vazia. Tudo que a voz que perpetuava o caminhar percebia era que o tempo não tinha transcorrido. Apenas  revelara para aqueles que o observavam, de uma forma tão sutil, quase entreaberta, que se houvesse percepção concreta já haveria alteração da imagem capturada, e não poderia ser de outra forma. 
O existir concreto nunca permaneceu naquele tecido roxo-azulado da almofada que sussurrava para o decorrer do tempo que a própria finalidade do ato de utilizar-se se tornou irrelevante, e por isso a voz se ausentou. Ausentara-se juntamente com o corpo ainda morno daquele que um dia pode observar o vento e solidificar a vivência enquanto todo. 
Uma gota de água se desprendeu do malformado teto de madeira e se recostou parcamente no que sobrara de tempo a ser consumido na moradia. O círculo formado pelas pendências construía um terreno ilógico de existências irreparáveis que, por vezes, se cruzavam em uma tentativa inútil de se apropriar do significado de algo externo. As palavras só se apoiam em saberes não construídos, apenas aceitos. A voz é sempre passível de modificação. 
O ar é transitório e sua transitoriedade é necessária para que as paredes sejam erguidas. Não se constrói nada com a falta de correspondência. Uma folha branca se aconchega em um fiapo de ar que restava ali recolhido no telhado de palha da habitação que um dia fora verbal. Agora, apenas se colocava em meio à inexistência da falta de definição lexical.
Descanso. 



*Escrito por Fernanda Marques Granato
*Esse texto está protegido pela lei de direitos autorais.


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