sexta-feira, 15 de junho de 2012

Idiotices do João [11]

Na madrugada da rua, João observa, sente o frio no rosto, observa. Não há mais descrições, pensa, não se limitará a modelos viciados, argumenta. Tentaria arrancar de si próprio, mas na verdade é o que faz. Estrangula a vontade. Não é isso? João desdiz seus pensamentos. Tenta evitar, mas estão ali. O toque de Maria causa-lhe algo. Esqueça-a. Ela não acredita no que João diz, ela não o deseja. Esqueça-a. João aperta o passo na madrugada. Repte-se na ladainha. Não há vítimas nem culpados aqui. João deseja a grandiosidade. E o que fará com isso? Conversas, e galanteios. Não, nenhum. Não preenche, não serve. João retoma. Precisa rasgar a própria alma para que compreendam. Não adianta. Se todos pudessem tocar a mente um dos outros, o mundo seria um lugar melhor? Se todos tivessem acesso ao âmago do outro, compreender-se-iam melhor? Se eu fosse como a chuva, que une os eternamente distantes céu e terra, poderia eu tocar o coração de outro alguém? João pondera pela insanidade das relações. João pensa em Maria, outra vez, deseja-a. Não apenas por... João não consegue dizer em palavras. Mas não há crédito. Há descrença. Paradoxos. Não há vítimas. Expressa-se mal. Quantas tolices são necessárias para que se entenda? No instante já, deste momento aqui, perdeu-se o que ia falar. Fale-me agora! Não. Não há vontade agora. Perdeu-se. Retornará. Sempre. José mandou tirar as descrições. José, o melhor amigo, aquele que o entende. Mandou tirar as descrições. João retirou. Porque não há necessidades maiores de explicar o que está explícito. Por isso, não há o que dizer. Ações falam. João retira suas cordas vocais. Quando andou até lá, quando anda até lá, os dias todos, fones de ouvido, o que pretende? Busca os cantos escuros, para que não o incomodem. Quantas tentaram se aproximar? Não há nada aqui. Perdeu-se as mais preciosas falas, sentimento passou. João olha para Maria com os olhos da mente. Esqueça-a. Não há nada. Mentira. Deseja-a. Deseja o corpo, a mente, a alma. Como provar que seus sentimentos são verdadeiros? E são mesmo? O que é real? Só o que é palpável? Certa vez, Maria insistiu que o amava. João negou. João não acreditou. João repeliu Maria. Ela retornou. Insistiu. João repeliu outra vez. Maria insistiu de novo. Era real então? João apostou. Mas acabou. Nada dura para sempre. Insignificâncias não combinam. Não combinavam. Era louca e dependente. João observa potenciais, até mesmo a falta de potencial. Após duas semanas, agarrou-se com outro. Claro. Não era real. João seguiu. Maria, anos antes amou-o. Era à sua altura. Mas acabou também. Está bela agora, bem longe. Combinaram, e não combinaram. E quando Maria veio de muito longe, para treparem em motéis baratos, João se lembrou. Lembrar-se-ia sempre. E para sempre. Falta de significados. Por que agora seria diferente? João corteja Maria desajeitadamente. Ela não acredita. João também não se fez acreditar. Uma tolice? Pensa demasiado, sente. Sente? É real. Por que quer que seja? João não se explica. Recolhe-se em sua cubata, seu mundo. Enxerga com os olhos da mente, e respira na escuridão. Terras puras em total escuridão. Respirou forte, para concentrar a energia. Sempre energético. O caminho da Supremacia ou o caminho do Herói Épico? Crescer através da mudança e liberdade ou lutar por propósito e equilíbrio. João quer virar magma. Queria que fosse uma ilusão, mas não é. O que são sentimentos? Se João desistir agora, esquecerá. Esquecerá? Encontrará Maria outra vez? Arrepender-se de jamais tentar? João queria dizer, mas não pode. Não deve. Respira e pensa em Maria. Por que essa insistência? Sente-se melhor quando está apenas por si só. Segue em frente, ignorando todos ao redor, é tolice. Quantas insignificâncias! É tudo uma tolice. Remexem-se nas pseudo-políticas, molecada esquerdoide. Tem de fazer o que acha certo. O outro extremo é ainda pior e nojento, patético: os reacinhas. São um lixo ainda mais imundo. Mas ambos os extremos são bitolados. Então, por que se preocupar? Não está explicando direito. Falta habilidade? Sim. Deseja que a história extrapole todos os limites, cansado de ver tantos quantos compartilhando imagens e brasões e recadinhos de histórias dos outros. Deseja que sua própria história seja aclamada, que os personagens que criou é que sejam o máximo, amado por todos. Não, não apenas isso. Deseja contribuir para o imaginário da humanidade. Encantar como o encantaram. José disse pra arrancar as descrições, então o fez. Jamais se igualará a modelos simplórios e viciados, jamais. João retoma Maria. Por que insiste? Será grandioso, gosta de pensar. Isso sim é ilusão. É? Tem de insistir, tem de tentar. Se não consegue largar, se não consegue desistir, apesar de todas as confusões e contratempos, apesar de todas as rejeições e desentendimentos, é porque... sim. Tem de admitir. Admitiu para si mesmo. Falará a Maria? Só quando a encontrar pessoalmente. Somente. Desgastes. Aquele samurai andarilho, por exemplo. Aquele da cicatriz em forma de cruz. Uma das histórias mais deliciosas e incríveis que João conhece. Então. O andarilho achou que foi incapaz de proteger a mulher que amava, e se jogou num abismo de esquecimento e escuridão, assombrado também por seus crimes de incontáveis assassinatos no passado. Mas por que não conseguia largar sua espada? Por quê? Porque a resposta sempre esteve ali. Aquilo que você não consegue largar é a resposta que procura. E aquele samurai andarilho entendeu que sua missão era arriscar a própria vida para proteger as pessoas, para que sua vida passada de assassinatos chegasse a um bom termo. Assim é João - em escala menor, é claro. Menor? Causou muitos ferimentos no passado, dilacerou almas. Assombrado pelos crimes, sempre. Assombrado pelo passado. Perguntam porque não tenta isso ou aquilo. Já tentou, já fez. Esgotou-se, traumatizou-se. Enxergando apenas seu próprio lado? Sim. Desprezível? Não deseja enxergar-se dessa maneira. João deseja Maria, sonha com Maria, sonha com o dia em que ela finalmente o aceitará. O que deve ser feito então? João não sabe, nunca saberá. Tem de agir conforme... tem de crescer através da mudança para atingir o equilíbrio. Há propósito na liberdade. Sim.

João se retira para respirar na escuridão. Na verdade, ele já sabe o que acontecerá. Sempre soube. retira-se e respira. Em solidão em silêncio... até o dia prometido.


**As opiniões expressas nesse post são de total responsabilidade do seu autor.**

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