segunda-feira, 13 de abril de 2015

Idiotices do João [77]


Eu gostaria de ter algum orgulho. João se levantou do quarto escuro. Eu gostaria de ter algum orgulho. João, me ajude. Suas roupas brancas estão sujas da lama dela. Uma vez mais. João, por que você está insistindo nesta bobagem? Não há aqui um caminho. Vamos entender. Sabe onde está a sua solidão? Onde você a esconde? João, poderíamos fazer sentido, ao invés de somente falar para que isto aqui volte a ter palavras. As palavras fogem. Eu gostaria de mergulhar mais. O que eu gostaria de dizer. Estamos desviando. Abutres com cara de velhos caquéticos, estão desviando os seus pensamentos, estão te distraindo. Estão todos falando da série da moda ou da causa da ocasião, temos de ser importantes. Estamos nos repetindo. Está escuro aqui e estou só. Por que estou fazendo isso? Talvez encarar fosse ruim, o que estamos fazendo e o que pretendemos? Eu sei, mas não ouso falar em voz alta. Temos apenas que fazer. Certo? Nós? Está voltando com isso, meu caro João? Pensei que não houvesse mais nós. Com quem você está falando? Prolixo. Está vomitando sem vontade, apenas por fazer? Ora, ora. É um número poderoso, não deveria ser desperdiçado. A vida é uma ampulheta. A vida atual, este ano. Isto aqui não tem valor. Velha explosiva chata pra cacete. Cuidado para não se expor demais. Haveria dignidade. Haveria dignidade se soubesse fingir melhor. Se soubesse fazer como os outros que sabem mentir tão bem a ponto de parecerem interessantes, sérios, atraentes, apaixonantes. O rapaz cego da série impõe respeito, de poucas palavras, voz grossa, herói trágico, torturado, íntegro. Todos querem ser. Após todos estes anos, deveria saber fingir melhor, meu caro João. Já passamos da fase de nos chicotear e nos lamentar das ações erradas que tomamos. O que importa é o que aparenta ser, não o que é de verdade. Você mesmo já se apaixonou por imagens. Se apaixona. Será? Será que você realmente ama os defeitos de outro alguém como tanto alega? Será será será? O que Maria diria disso? Não vamos falar de Maria agora. Não ouse. Fique em silêncio. Você sabe o que acontecerá. O futuro é sempre incerto, não há o que temer. Você já sabia. Será que teremos de fingir melhor? Todos são vulcões, desesperados, querem ser olhados, admirados, respeitados, amados. Sou um Conquistador, que nem diz a música. Você é meio patético, não é? Na escuridão, as músicas dizem muitas coisas. Aquela música da moça bonita diz pra você perdoar a si próprio, diz que as trevas irão embora pela manhã, que todos cometem enganos e que as tristezas vêm e vão como as estações, sem motivo algum, você teve de pausar a música da outra bonita moça, a torturada, todas são torturadas, todos, músicas bonitas sobre si próprios, amores perdidos, você ama alguém, meu caro João? Você sem dúvida não sabe o que é isso, alquebrado nesse seu canto, nessa idade não é idade de falar sobre isso, meu menino João, falar de amor é para os jovenzinhos, o que é a vida, João? O que diabos você quer da vida? Você sabe, você só não fala em voz alta, não tem coragem, é isso? Maria não está aqui, embora esteja, não idealize, vai espantar, você sabe, quem idealiza não compreende, você deveria ser mais esperto, deveria saber fingir melhor, você não tem nenhuma classe, meu caro João, mas ao menos bato palmas porque escalou o penhasco e encontrou a flor, a flor que não estava lá até que você subiu, é disso que estou falando, faça mais sutliezas subentendidas, por gentileza, assim não atrai ninguém,  quem compreende, tenho que trabalhar com todas as clientelas, foi o que foi dito, mas não é isso que se quer, pare de falar, João, pare de se revelar demais, quantos mistérios teríamos que fingir? Deveríamos ter ido no evento, talvez, deveríamos, e ao projeto que as pessoas perguntam e solicitam? Esporádico, aos quantas seres que rastejam na sua garganta, moscas, vermes, o que se passa nesta sua cabeça, João? Pare de fingir que é inteligente, pare de fingir que é importante, você não tem coragem de falar em voz alta o que se passa na sua alma de verdade, você não tem coragem, você está sozinho no escuro há dias, há meses, você se esconde, se oculta, você se fortalece, se fortalecer do quê? Você será mesmo o maior do mundo? Isso é um objetivo infantil, ser maior em quê? É que nada tem sentido, no fim vamos morrer e seremos todos devorados pelos vermes da mesma forma. É por isso que você se agarra tão firmemente a símbolos, meu caro João? Você daria a sua vida para que… para nada. Se eu fosse a chuva, que une os eternamente distantes céu e terra, eu poderia unir meu coração ao coração de outro alguém? Você já disse isso, João, e está imitando isso de outro lugar, na cara dura, cara dura, que clichê horroroso, por que você está se criticando outra vez, João? E elas que te odeiam pelo texto? Você nunca vai se livrar dessa culpa? Você vai se culpar para frente? Você vai se lamentar para sempre? Seu estúpido! Você está se xingando de novo. Agora é aquela música, falso é a nova realidade, diga-me qualé que é, realidade é todo um trato, falso é o novo real, que tradução horrível, feita de qualquer jeito, aonde você quer chegar, João? Você sabe como tudo terminará, você já sabe como vai ser, então por que essa ansiedade? Por que essa insegurança? Finja ao menos mais certeza e seriedade, continue fazendo e aguarde, aguarde, tudo dará certo sim, pois, afinal, você é o maior de todos, meu caro João.

**As opiniões expressas nesse post são de total responsabilidade do seu autor.**

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