A voz que sai da minha garganta, toda torta e sem saber para onde tornar, soou tão estranha que quase não a reconheci. Quase que a onda levou toda a leveza que um dia pensei que sentiria embora e não sobrou grão algum de areia para me afagar na minha incompletude existencial. Talvez nunca soubesse o que significaria se duas notas incongruentes saíssem sozinhas de minhas cordas vocais sem amparo algum de qualquer freqüência cardíaca.
Talvez o vazio que sempre me deixou nunca precisou de tanta estrutura que agora tanta falta me fazia. A estrutura instável na qual minha fraca voz se apóia é definitivamente insuficiente para qualquer arcabouço teórico se ambientar, ou mesmo se formar. A formação de conceitos sempre foi balizada por altas horas de imersão poética no coração de todos os amantes inovadores da desgraça que é pensar sem parar e nunca ter um pensamento no qual um dia pudesse se ausentar e se aconchegar, para um dia estar, em paz, sem nada em mente.
O vazio é tão atraente e tão inconstante quanto a secura em um duplo olhar revigorado por duas manhãs sem orvalho. A tristeza nos olhos daquele que caminha de fato é inevitável de se notar. Nunca vi a tristeza tão de perto. Ela é quente e acalentadora. Os ventos do norte haviam mentido para mim. Nunca imaginei que chegariam a esse ponto para me fazer voltar a realizações subjuntivas. Ah, se eu pudesse existir no vazio…não quereria mais nada.
Querer nada é um tanto paradoxal, pois para se querer o nada é preciso ter atingido em cheio o todo e estar absolutamente farto. Estou farta de pensamentos, de preocupações e de medos desnecessários. Por vezes uma nuvem me visita sem cerimônia e me consola com duas ou três gotas irreverentes que me nutrem como se fosse verdadeiramente ressecada por gerações sem fim guerreando por mais cuidado seriado.
A reprodução de atitudes que não mais considero adequadas me fez observar o quão inútil é pensar a sujeira como partículas inconvenientes. Por que a inconveniência seria inoportuna? Por que os momentos devem ser repensados? Por que os planos que a chuva faz devem levar em consideração a ventania que cedo nos visita? Por que a tristeza nunca nos deixa por completo? Por que os momentos de autorreflexão são sempre pincelados por fortes dores na alma por chuvas que caíram fora de hora e por ventos que sopraram forte demais?
Talvez a existência não fique bem planejada, e exista melhor assim, sem previsão. Talvez a existência incerta entenda, profundamente, que não saberia apenas ocupar espaço se essa fosse a sua função pré-definida. Os espasmos ocupam os músculos, e não lhes tomam o tempo com grandes elucubrações mentais, apenas como conseqüência de interagirem em um mundo sempre mutante.
Nunca saberemos o porquê da resposta que nunca vem, e da pergunta que nunca fica na mente. As dúvidas deveriam peregrinar na nossa mente sem limite de tempo.
A resposta é que envelhece, e precisa ser reposta.
A voz não é necessária mais.
Apenas a existência extra corpórea da consciência.
*Escrito por Fernanda Marques Granato.
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