domingo, 8 de dezembro de 2024

Ausência de batimento cardíaco


Perder. Continuar viva com o corpo morto. 

Banhar-se e nada fazer sentido. 

Esquecer-se de comer.

Não ter espaço livre de dor para inspirar.

Querer morrer, mas ter a sensação de já ter partido. 

Para que continuar viva se nada nos aguarda?

Para que cobrir o vazio? É tarde demais. 

Afinal, eram só alguns andares, que diferença aquilo faria?

A queda é apenas o começo, mas é também o fim, é o círculo-resumo de tudo que um dia já teve propósito.

Não aguentar mais.

Não querer mais ouvir o vento.

Nada mais aguça o interesse. 

A vontade de se anular é muito mais forte que qualquer dor já sentida, mesmo a que me reconfigura por completo, peça por peça, até eu deixar de me reconhecer. 

Sim, sou inadequada. Sim, há incapacidade constatada. Sim, a perda é necessária e inevitável. De fato, é tarde demais, especialmente se considerarmos todo o espaço que o vazio ocupa. 

A dor é o novo eixo. É a reorganização de todas as correntes. É a náusea de viver, a ânsia pelo fim, e a ausência de tempo para esperar. Tarde demais. 

Perder é viver com a culpa para sempre de todo o mal a ser causado no mundo no futuro. Perder é fazer amizade com a culpa, e vê-la como aliada, até criar outro enquadramento de si que seja inerte, apático, despido de todas as cores e sabores com os quais já ousei um dia sonhar, até que a perda se torne irreversível e se torne uma identidade em si mesma, e só me reste viver a ausência por todos os dias futuros até que, logo, nada mais tenha relevância. 

Um corpo amanhece inchado no rio. Muito trânsito. Tarde demais. 




**As opiniões expressas nesse post são de total responsabilidade do seu autor.**
*Texto por Fernanda Marques Granato protegido pela lei de direitos autorais.

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