quarta-feira, 3 de julho de 2013

Idiotices do João [48]


- Sentimos muito ciúme quando você está agarrada com outra, João!
Sentimos muito ciúme da mera existência alheia. Um outro respira e se demonstra mais feliz e resistente. O sangue está correndo feito veneno, as entranhas estão queimando. Eu queria lhe dizer que a amo, mas sou uma pessoa triste. Você não pode expor publicamente a tristeza, pois é clichê, é coisa de adolescente, você tem de ser uma pessoa forte e adulta sempre, é o que eles dizem. Nenhuma insignificância é permitida. João conversava com a amiga, pelos meios eletrônicos, confissões foram abduzidas de forma brutal. Os casamentos terminaram, ela tentou consternar, mas era tarde. Muitos olhos, pouquíssima sanidade, é o que foi dito. Mas há os pés se fincando, há a formação dita acadêmica na qual pode se habituar, perante o mundo real de boas maneiras e costumes. O estagiário olhou para a tela, até o momento em que vomitamos na rede social e João disse que nem mesmo trepada resolve para se acalmar. Maria disse que sente ciúmes, Maria procurou João novamente, Maria disse a João apenas porque João estava abraçado a uma menina dessas qualquer e nada mais, apenas abraçado, podemos saltar pela janela e voar, será que as aranhas na minha cabeça permitiriam tal coisa?
Uma pequena pausa.
Então pululou na tela o menino de oito anos que ficou milionário vendendo bolinhas de gude. Gente, qual a necessidade disso? Aí vai conversar no café sobre a possibilidade de assumir um outro papel desses qualquer, relações de tecnologia com clientes tais. Está bem. A mesma coisa de porra nenhuma, você tem de trabalhar no que gosta, é lógico, e quando você não gosta de nada?, não faz nem sentido nenhum desses ofícios, claro, vamos fingir que entendemos e que tudo isso é muito importante, apareceu Maria, Maria é casada e ganhou prêmio, ela não se chama Maria então?, é uma criança birrenta mesmo, no que está pensando?, o estagiário voltou e olhou para a tela, João, poderia por obséquio atender à solicitação da fulana?, umas conversas da alma no telescópio, podemos nos abrigar em rompimentos, terminou e agora você deve sobreviver a esse ritual de passagem e viver, criou conteúdo como há muito tempo não havia feito, sinceridades para degustar rancores, de quantas invejas precisamos para dar um passo a mais?, nem falaremos de solidões para não nos intumescermos com, com o quê, esquecemos, mais uma pausa, e ela disse que talvez o proletariado a levasse a alguma coisa, vamos fingir que tudo isso é importante, vamos fingir, enquanto outros encontram meios alternativos, enquanto outros tentam outras coisas, alguma maluquice, nós gritamos para ela, não acreditamos no caminho convencional!, não teremos formação!, não acreditamos em nada disso!, nosso texto tem cheiro e cor, falaram, cheira a merda, mijo, sêmem, incomoda, alfineta, achei que você fosse se perder por uns instantes mas o final é lindo demais, um soco no estômago, assim disseram, sentimos ciúme da mera existência alheia, Maria entenderia que poderíamos conviver, à distância e sem exigências, apenas gostaria que nominalmente disse que, que o quê, ah, estamos juntos, poderia dizer, um adolescente adulto, meio ridículo, gostaríamos, desejamos, iremos, beijar Maria uma vez mais, o melhor beijo de todas as existências, não queremos mais, quer dizer, queremos, tenho medo dos seus sentimentos excelsos, eu não mereço tudo isso, eu adoro seu jeito mas você me dá medo, foi o que Maria disse, é o medo, medo, medo, vamos sair, saindo com outras que não se chamam Maria, outras mais, não se chamam Maria, por isso não será prazeiroso, como as últimas não foram, nunca serão, você dirá que João está obcecado, João está vazio, não temos nada aqui, temos bastante mas não conseguimos abrir, não conseguimos florescer, eu queria apenas me comunicar, somos tristes, somos deprimentes, somos deficientes emocionais, o funcionário João preza pela máxima eficiência, o declínio foi realizado conforme solicitado, o menino de oito anos enriqueceu, todos aplaudem mas ninguém se arrisca ao exemplo, todos seguem o caminho da formalidade, João escolheu a trilha dos gritos, mas não alcançou pontuação suficiente ainda, não se arriscou o suficiente, quantos potenciais João guardará dentro de si até explodir de frustração?, Maria diz que sente ciúme das outras, Maria fica à distância para não magoar João, Maria não percebe que se distanciar magoa João ainda mais, quantos sentimentos existem aqui?, o estagiário olhou de novo para a tela, pensa que seu mestre não se dedica ao que deveria, estamos de camisa e terno, estamos na frente do computador, estamos bem adestrados enquanto o menino de oito anos enriqueceu vendendo bolinhas de gude, Maria sente ciúme das outras e João sente inveja de todas as coisas que existem sorrindo neste mundo.

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