Às vezes a redoma na qual me encontro se remexe toda e eu me encolho inteira com medo de não saber existir sem ela ao meu redor, para me dizer quando respirar e quando contornar o pedaço sem margem de respiro. Sinto falta daquela respiração profunda que me leva a outros mundos além da redoma, que não me deixam estar acomodada. O incômodo me faz inquieta diante do eterno esperar, apesar de me levar a inevitável conclusão de que devo aguardar a insatisfação chegar para fazer algo a respeito, e nunca deixar a conformação se ajeitar acomodada.
Nunca devemos nos acomodar. O passado está aí diante da sombra de todo dia anterior para nos mostrar a que viemos, para vermos que nada somos se continuarmos desconstruindo, que nada somos se não revelarmos o desvelado em nós. Por vezes precisamos deixar de existir para existirmos por completo, e percebermos, com total introspecção, de que forma nos colocamos nesse mundo que nos quer todos preparados para o ontem, como se soubéssemos que o inesperado virá nos arrebatar e que teremos que enfrentá-lo sem garras ou grilhões.
Enfrentar o frio estando acalentado está longe de ser considerado conduta desafiadora, porém quando se acrescenta que a baixeza da temperatura foi causada por altas temperaturas internas que devem ser remediadas por longas auto-reflexões para as quais não há tempo, aí sim, aí sim temos uma situação que nos exige, de fato, uma conduta ousada. Ousadia é algo que deve ser fruto de um posicionamento bem definido diante de todas as marés fortes e contracorrentes, e nada pode ser enigmático a esse respeito. O posicionamento é uma das poucas coisas, se não a única, acerca da qual não pode haver alternativa. Apenas uma escolha é viável, e enquanto ela não se delineia e todo o percurso é desconstruído pelo inexorável, nada pode ser previamente definido como errado.
Antes de se certificar do erro, deve-se conhecer o caminho a ser criado e descobrir que ferramentas são necessárias para tal empreendimento. Será que temos essas ferramentas? Será que somos capazes de descobrir do que é feito o inesperado? Será que conseguimos lidar com o acaso como sendo uma parte integrante de nossa pessoa, como o inconsciente? Será que o fragmento pode se tornar percepção maior da nossa realidade do que as definições denotativas de cadência diacrônica que nos fazem auto-perscrutar como se não houvesse outro tipo de luz aí afora?
Sempre há luz. O acaso é todo meu. E nada pode ser feito a esse respeito. Devo aceitar a sombra como parte definidora da minha luz, pois essa característica traz em seu núcleo a possibilidade de existência de sua negação, do total oposto da sua essência. Sou forçada a acreditar, ou pelo menos considerar a possibilidade de estar sendo visitada por perguntas de outros que se projetam em meu interior carregando suas dúvidas. Não sei ao certo o que fazer com suas perguntas. Apenas sei que as minhas estão aqui, sem rumo e sem cadência. E eu preciso fazer algo a respeito disso. Não posso esperar o caminho ser reconstruído por outra subjetividade.
Devo aceitar que a minha dará conta de apontar possibilidades, e que todas podem estar descoordenadas, porém isso não descarta a possibilidade da combinação dos fatores como letras soltas que, se unidas, dão origem às mais diversas composições lírico-românticas. O que será feito do fragmento contemporâneo? Não tem a resposta para essa pergunta em meu bagageiro emocional. Preciso conectar-me a outra interioridade. Alguém?
* Esse texto está protegido pela lei de direitos autorais.
* Texto escrito por Fernanda Marques Granato.
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